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Análise | Decarnation

Decarnation-2023

A busca pela perfeição é uma árdua caminhada; a sensação de nunca se sentir suficiente é constante, e a vida vivendo de forma marginalizada é como dançar balé em um cabaré.

Bebendo bastante dos filmes Cisne Negro e Perfect Blue, Decarnation é um jogo de terror 2.5D lançado para PC e Nintendo Switch que aborda de forma perturbadora diversas temáticas relacionadas à busca pelo padrão e autoaceitação em uma Paris dos anos 90.

Um título extremamente enigmático, repleto de diálogos e mecânicas que irão trazer à tona questionamentos existencialistas, enquanto te faz pensar se o que está acontecendo é real ou um surto da cabeça da protagonista.

Ficou curioso? Venha comigo que vou te mostrar até onde a pressão social é capaz de te levar!

Cisne Negro de Cabaré

Decarnation começa de forma direta, nos apresentando a protagonista Glória, uma dançarina famosa na cidade da luz. No entanto, acontecimentos fizeram com que ela entrasse em decadência. Dançando para homens degenerados no cabaré Cisne Negro, sua vida se resume à mesmíssima rotina triste, recheada de ressentimentos.

Porém, sua vida toma uma virada de chave quando, após posar nua para um artista plástico, ela chama a atenção de um grande empresário do ramo das artes, que quer investir nela para se tornar uma dançarina premiada.

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Entretanto, a cabeça de Glória não está nada bem e começa a ser perturbada em seus sonhos por criaturas aterrorizantes e grotescas, chegando ao ponto de não saber mais o que é real e o que é sonho. Encontrando-se em uma encruzilhada, ela precisa lutar contra seus sentimentos e medos, a fim de se mostrar forte para poder alcançar a tão desejada fama que lhe foi tirada.

Um história escrita em forma de poesia

Decarnation é um título com foco total em seu enredo. Sua narrativa é seu grande charme, principalmente por se propor a discutir temas sensíveis como o machismo e a LGBTQIAP+ fobia na década de 90. Apesar do jogo se passar em Paris, na França, o mundo todo passava por um processo de mudança extremamente violento, que foi retratado no título de maneira magistral.

A protagonista de Decarnation é uma mulher artista de cabaré lésbica, o que, por si só, já a coloca de forma marginalizada na sociedade. Os roteiristas foram precisos ao apresentarem aos jogadores que os verdadeiros monstros do título não são aqueles que aparecem nos sonhos de Gloria, mas sim os próprios seres humanos e, pior ainda, os seus próprios sentimentos, que a atormentam e trazem à tona o que há de mais assustador: o preconceito enraizado em nossa sociedade.

Durante diversos momentos da história de Decarnation, os questionamentos e reflexões são inevitáveis, principalmente se houver um sentimento de identificação. Gloria poderia ser qualquer um de nós; eu ou você, que está lendo, poderia passar ou está passando pelas mesmas situações em que a protagonista se encontra. Um mundo sombrio, repleto de monstros assustadores e sem sentido, um paradoxo magnífico com a vida luxuosa que a cidade da luz propõe.

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Decarnation é uma poesia escrita de forma melancólica, que cativa os leitores de forma impressionante, colocando situações surreais e assustadoras de forma tão comum e real que traz um sentimento de impotência ao se deparar com a protagonista enfrentando as mesmas dificuldades que muitos de nós ainda sofremos em pleno século XXI, levantando a questão se houve alguma melhora.

Muitas mecânicas, mas infelizmente, nenhuma cativante

Decarnation encontra-se na Steam como um título com diversas mecânicas, vangloriando-se de inúmeros puzzles e desafios complexos em um mundo perturbado. Uma coisa é inegável: o título possui muitas mecânicas, mas nenhuma delas é cativante ou interessante o bastante.

Tudo parece ter sido feito de forma aleatória, colocado somente para preencher espaço e permitir que o jogador tenha o mínimo de controle, para que não se torne apenas um filme jogável, que, eu acredito, possui mecânicas muito mais interessantes do que isso.

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São inúmeros momentos de ficar apertando botões em uma sequência, em que, se errar, não acontece muita coisa, ou momentos de fuga de monstros que se resumem apenas a apertar um botão e andar.

Durante meu tempo com o título, tive a impressão de que ele tentou ser muitas coisas, mas no fim não possui nenhuma identidade própria, recheado de mecânicas que não têm relevância alguma.

Gráficos estranhos, mas uma atmosfera musical

Quando abri Decarnation pela primeira vez, tive um pequeno sentimento de estranheza em relação aos gráficos. Não que sejam ruins, longe disso, mas eles me remeteram a outro jogo bastante famoso de navegador que marcou a infância de muitos ao redor do mundo, o Habbo Hotel, devido aos personagens terem o corpo pequeno e a cabeça grande.

Mas, fora isso, os gráficos cumprem seu papel. Não são aquela maravilha mega realista e nem extremamente únicos, apenas entregam o que prometem e conseguem contribuir para criar uma atmosfera aterrorizante, tanto nos cenários quanto nos monstros.

Decarnation se passa em dois mundos diferentes. Durante o dia, você se encontra andando pelas ruas de Paris, a cidade da luz, e nesse período o jogo adota tons acinzentados para transmitir a atmosfera de solidão e tristeza, refletindo o estado da protagonista. No entanto, nem por causa desse filtro, os gráficos deixam de ser apreciados.

Agora, quando Gloria dorme, é quando o mundo dos sonhos entra em cena e os pesadelos da protagonista tomam forma. Uma referência direta à saga Silent Hill, o mundo distorcido é assustador, repleto de criaturas de gosma ou carne que espreitam pelas paredes, tornando a protagonista completamente indefesa em uma nova realidade que causa aflição e questionamentos sobre o que é real e o que é invenção de sua mente perturbada.

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Os desenvolvedores de Decarnation conseguiram criar duas realidades diferentes que conversam perfeitamente entre si e entregam uma experiência que, ao mesmo tempo, é fascinante e assustadora, contemplando questionamentos sobre o existencialismo e a crueldade humana, que são os principais vilões do jogo.

Tudo em Decarnation tem um significado, e é necessário tempo e mais de uma jogada para compreender todos os questionamentos propostos pelos desenvolvedores.

Trilha sonora impecável

Agora sim, disso eu não tenho o que reclamar, a trilha sonora de Decarnation é impecável!

Akira Yamaoka ficou responsável por compor canções originais, além de auxiliar na escolha de outras para compor uma melodia dos anjos. Já tendo trabalhado em títulos como Silent Hill e Lollipop Chainsaw, aqui ele entrega um trabalho impecável ao escolher a dedo músicas da história francesa que figuram em filmes como Amélie e Meia-noite em Paris.

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Além das composições próprias que trazem à tona toda a tensão e sentimentalismo que faltaram em alguns momentos do enredo, Decarnation confirmou que às vezes uma melodia consegue reproduzir o que mil palavras não conseguem.

Vale a pena jogar Decarnation?

Claro, com toda certeza! Apesar dos problemas com a jogabilidade e o excesso de mecânicas desnecessárias, Decarnation é um presente cheio para os fãs de horror que não gostam de levar susto e querem aproveitar uma história repleta de questionamentos sobre os problemas de uma sociedade que não melhorou e continua definhando nos mesmos pilares.

nota
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